quarta-feira, 26 de fevereiro de 2020

A Guerra Russo-Japonesa (1904-1905)


A Guerra Russo-Japonesa teve início a 8 de Fevereiro de 1904 e terminou a 5 de Setembro de 1905 com a derrota da Rússia. Esta guerra envolveu os teatros de operações da Manchúria, da Coreia e do Pacífico Norte. No início da guerra, o Japão era considerado um pequeno país, pouco conhecido no Ocidente, que tinha cometido a imprudência de desafiar a Rússia, uma das cinco Grandes Potências europeias. Depois da guerra, encontramos uma Rússia derrotada, humilhada, a braços com uma revolução interna, e um Japão vitorioso, embora com graves problemas financeiros causados pela guerra, uma Potência com grandes ambições imperialistas.

O Japão já tinha mostrado o seu valor militar ao derrotar a China na Primeira Guerra Sino-Japonesa (1 de Agosto de 1894 a 17 de Abril de 1895). Após esta guerra, a China e a Rússia estabeleceram uma aliança que garantia ao czar o direito de lançar uma linha férrea através da Manchúria que ligasse Vladivostok a Porto Artur e, por isso, controlar uma extensa faixa de território chinês. Em 1898, a Rússia instalou uma base militar naval em Porto Artur. Com a frota russa estacionada em Porto Artur e o seu (russo) exército a ocupar a península de Liaotung, os Japoneses tiveram a percepção de que seria uma questão de tempo até os Russos avançarem para ocuparem a Península da Coreia. Sendo assim, começaram a melhorar o seu exército e a sua marinha de guerra.

Representação de um combate entre forças russas (à esquerda) e japonesas (à direita). A imagem pode ser vista em tamanho grande em https://ukiyo-e.org/image/mfa/sc131768

As forças navais japonesas eram superiores ao conjunto das forças navais russas disponíveis na região. O poder naval da Rússia no Extremo Oriente consistia em 7 velhos navios de guerra, 9 cruzadores, 25 contratorpedeiros e cerca de 30 outras embarcações de menor dimensão. Em Fevereiro de 1904, a frota principal encontrava-se em Porto Artur, dois cruzadores em Chemulpo (Inchon) na Coreia e outros quatro em Vladivostok, imobilizados pelo gelo. A força naval japonesa consistia em 6 navios de guerra recentemente renovados, 8 cruzadores, 25 cruzadores ligeiros, 19 contratorpedeiros, 85 barcos torpedeiros e mais 16 embarcações de menor dimensão. A marinha japonesa tinha sido desenvolvida com o apoio de uma missão naval britânica e parte importante dos seus navios eram de origem britânica. O poder naval russo em 1900 (medido em tonelagem) era de 383.000 contra 187.000 do Japão, mas a Rússia tinha a sua marinha de guerra concentrada em quatro frotas: Frota do Báltico, Frota do Norte, Frota do Mar Negro e Frota do Pacífico.

Os efectivos disponíveis para o exército dependem da população sobre a qual é feito o recrutamento. Em 1900, a Rússia tinha cerca de 135.600.000 de habitantes e o Japão não mais que 43.800.000. Em 1904 estes números eram superiores, mas com uma proporção semelhante. Apesar de terem uma população menos numerosa, os Japoneses podiam rapidamente colocar no terreno as suas forças terrestres com um efectivo de 280.000 homens e podiam enviar um reforço de 400.000 reservistas bem treinados. No início da guerra os Russos dispunham no Extremo Oriente 100 batalhões de infantaria, 30 baterias de artilharia e 75 esquadrões de cavalaria. Os Japoneses podiam empenhar de imediato 156 batalhões, 106 baterias e 54 esquadrões, sendo esta a arma em que se apresentavam mais fracos.


O problema dos Japoneses era transportar as suas forças entre o Arquipélago Nipónico e o Continente Asiático e assegurar uma testa de ponto suficientemente ampla e segura para permitir o desembarque das suas unidades militares e garantir as operações logísticas necessárias. Para tal seria necessário garantir a supremacia naval na região o que exigia iniciativa e surpresa, condições que o Japão garantiu lançando um ataque seguido de um bloqueio à esquadra russa fundeada em Porto Artur sem previamente ter declarado guerra à Rússia [A declaração de guerra é uma prática que se tornou obrigatória nos termos da Convenção (III) relativa à Abertura das Hostilidades, Haia, 18 de Outubro de 1907.  A Convenção foi assinada pelo representante Japonês, mas apenas foi ratificada a 13 de Dezembro de 1911 [Texto completo em https://ihl-databases.icrc.org/ihl/INTRO/190?OpenDocument ou http://avalon.law.yale.edu/20th_century/hague03.asp. Visto em 2019-05-16].

Os Russos tinham um problema diferente: a extensão da sua linha de comunicações. O transporte de pessoal e dos abastecimentos para o exército russo no Extremo Oriente era feito através de uma linha férrea, de via simples, com uma extensão de 8.850 Km entre Moscovo e Porto Artur. Os comboios tinham de esperar, em locais específicos da linha, pelos que transitavam em sentido oposto, o que tornava o trânsito lento e reduzia a capacidade de transporte desta infraestrutura. Estas dificuldades faziam com que o efectivo das forças militares russas no Extremo Oriente não ultrapassasse os 140.000 homens e mesmo assim o seu abastecimento seria feito com limitações.

No dia 8 de Fevereiro de 1904, os Japoneses lançaram um ataque naval de surpresa sobre a frota fundeada em Porto Artur e teve início o bloqueio do porto que durou até ao dia 2 de Janeiro de 1905 quando a guarnição do porto se rendeu. Todas as tentativas feitas pelas tropas e marinha russas para romperem o bloqueio resultaram em fracasso. No segundo dia das hostilidades foram afundados dois navios russos ancorados no porto de Chemulpo (Inchon), na Coreia. Foi aí que desembarcaram as primeiras tropas japonesas (12ª Divisão de Infantaria). Os Russos retiraram da Coreia e sofreram sucessivas derrotas na Manchúria. A Batalha de Mukden (21 de Fevereiro a 10 de Março de 1905) foi a última batalha terrestre travada entre as forças das duas Potências. Os Russos foram obrigados a recuar para não verem cortada a sua linha de comunicações, mas fizeram-no em boa ordem. Nesta altura, cada um dos contendores tinha no terreno mais de 300.000 homens.

A 27 de Maio de 1905 foi travada a Batalha Naval de Tsushima, uma vitória decisiva do Japão. Os Japoneses perderam três torpedeiros, mas afundaram 21 navios russos. As baixas japonesas foram de 117 mortos e 583 feridos, mas os Russos sofreram 4.380 mortos e viram capturados quase seis mil dos seus homens. Os Russos perderam nesta batalha parte da Frota do Báltico que tinha sido enviada para formar a Segunda Frota do Pacífico. O Japão, um pequeno país, pouco conhecido no Ocidente, tinha derrotado uma das cinco Grandes Potências europeias.

Almirante  Tōgō Heihachirō, comandante das forças navais japonesas na Batalha de Tushima [https://en.wikipedia.org/wiki/T%C5%8Dg%C5%8D_Heihachir%C5%8D#/media/File:Togo_Heihachiro_in_uniform.jpg]
Com crescentes dificuldades em continuar a guerra devido à contestação interna, a Rússia aceitou participar numa conferência em Portsmouth, New Hampshire, a fim de negociar com o Japão os termos da paz, com mediação do Presidente dos EUA, Theodore Roosevelt (1858-1919). O Japão, com dificuldades financeiras devido ao esforço de guerra, concordou em participar na conferência que decorreu de 9 a 29 de Agosto de 1905. No dia 5 de Setembro foi assinado o Tratado de Paz de Portsmouth. Foi reconhecida a conquista da Coreia pelo Japão, que também ganhou o controlo da Península de Liaotung e de Porto Artur, da metade sul da ilha de Sacalina e da linha férrea no sul da Manchúria que conduzia a Porto Artur que teve de ser abandonada pela Rússia.

O Governo do Czar estava a aproximar-se do fim. A má gestão da guerra, tanto pelos governantes como pelos generais, o seu elevado custo em recursos humanos e financeiros, encorajou os movimentos radicais em Moscovo e São Petersburgo que começaram a defender uma revolução. A revolta de 1905, que o Governo russo suprimiu, lançou as bases da Revolução de 1917, também esta lançada contra uma guerra que estava a ser perdida. Do lado do Japão, a vitória foi recebida com alguma crítica pela opinião pública que acreditava que o Japão merecia mais compensações de guerra, mas também incentivou a que fosse utilizado o poder militar para, na Manchúria ou outras regiões, fosse garantido o acesso a matérias primas que a industrialização exigia e que não existiam no seu território.

Pela primeira vez na História Moderna, um país asiático derrotava uma Potência europeia. Em África, os Italianos tinham sofrido uma humilhante derrota frente às tropas da Etiópia, na Batalha de Adwa, a 1 de Março de 1896, mas os Etíopes tinham uma superioridade numérica de 5 para 1. Mas o mais importante desta guerra é que ela constituiu uma antevisão do iria acontecer na Primeira Guerra Mundial. As frentes de batalha eram extensas, as batalhas prolongaram-se por alguns dias e foram amplamente utilizadas trincheiras, metralhadoras, morteiros, granadas, minas terrestres e navais, arame farpado, tiro indirecto de artilharia, transmissões rádio e até actividades de uma verdadeira guerra electrónica. Em ambos os lados existiam observadores ocidentais que reportaram para os seus exércitos o que puderam observar. Segundo estes observadores, o soldado russo era corajoso e com elevado espírito de sacrifício, mas os seus oficiais mostraram-se incapazes de desempenharem as funções para que tinham sido nomeados. Sobre os militares japoneses referiram a sua excelente preparação e o seu sentido do dever que atingia o nível do fanatismo.

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