Desde o início de 1871, quando se deu a unificação da Alemanha, Bismarck tinha mantido a Europa em paz, excluindo as questões dos Balcãs. Com a sua saída da cena política, em 1890, a política externa alemã foi profundamente alterada. O Tratado de Resseguro (1887) entre a Alemanha e a Rússia não foi renovado no mesmo ano em que Bismarck abandonou o cargo de Chanceler e a Rússia estabeleceu uma aliança com a França (1894). Embora se tratasse de uma aliança defensiva, permitiu à França sair do isolamento em que tinha sido colocada em 1871. Esta aliança entre a França e a Rússia causou apreensão à Alemanha e ao Reino Unido. À Alemanha, porque passava a enfrentar a possibilidade de uma guerra em duas frentes. Ao Reino Unido, porque era justamente com a França e com a Rússia que os seus interesses ultramarinos mais colidiam, em África e na Ásia Central. Até 1894 existia um único sistema de alianças, a Tríplice Aliança. Após esta data, quando se estabeleceu a Aliança Franco-Russa, foi criado um bloco que seria alargado com a Entente Cordiale em 1904.
Fora da Europa também se verificaram grandes mudanças, não só porque o domínio europeu continuou a estender-se em vários pontos do globo criando situações propiciadoras de um conflito entre as potências europeias, mas também porque os Estados Unidos da América e o Japão concorreram nessa expansão entrando no núcleo dos atores principais da cena mundial. No Extremo Oriente, à semelhança do que sucedia com o Império Otomano, o Império Chinês estava em franco declínio e era alvo de cobiça. O Reino Unido tomou a iniciativa, no que foi seguido por outras Potências, de obter concessões e estabelecimentos comerciais em Shangai e outras grandes cidades chinesas. Em breve, uma parte importante do comércio exterior da China era materializado por trocas comerciais com a Grã-Bretanha. Em 1900, o Reino Unido e a Alemanha concluíram um acordo pelo qual as duas Potências garantiam o princípio de “Porta Aberta” na China e a manutenção da integridade territorial do Império Chinês. [Lista dos ex-enclaves estrangeiros na China - https://pt.wikipedia.org/wiki/Lista_de_ex-enclaves_estrangeiros_na_China]
No Norte da China, A Rússia procurou assegurar um porto liberto do gelo de inverno e que servisse de terminal à Linha Transiberiana que tinha começado a ser construída em 1891. A posição estratégica da Rússia no Nordeste da Ásia ficaria muito fortalecida com o acesso a um porto sem gelo. Vladivostok era um bom porto com dois grandes inconvenientes: encontrava-se bloqueado pelo gelo durante três a quatro meses no ano e tinha saída para o Mar do Japão o que significava que podia ser facilmente controlado por uma potência adversária. Um porto mais a sul implicava controlar a Manchúria. No Sul da China, o Reino Unido tinha anexado a antiga Birmânia (hoje Myanmar) e a França tinha ocupado a Indochina, os territórios que hoje pertencem ao Vietnam, Laos e Camboja. Por outras palavras, a Rússia, a França e o Reino Unido dispunham de boas plataformas para invadirem a China. A Rússia era favorável à ocupação de vastas áreas da China e opunha-se à política comercial de Porta Aberta defendida pelo Reino Unido e pela Alemanha. O Japão via a Península da Coreia, então um Estado tributário da China, como uma plataforma a partir de onde poderia ser atacado pela Rússia, mas também uma testa de ponte para a aquisição de territórios no Continente asiático.
No início do século XX, as Potências europeias controlavam a quase totalidade de África. A expansão colonial de Portugal, Espanha, França, Reino Unido, Bélgica, Itália e Alemanha abarcou vastos territórios africanos sob a forma de colónias ou protetorados. A Etiópia e Marrocos mantinham a sua independência, mas enquanto o primeiro país o tinha conseguido derrotando os italianos, o segundo estava cada vez mais dependente e manietado por aquelas Potências. No Médio Oriente, o Império otomano estava em declínio e a Rússia mantinha a ambição de controlar os Estreitos, situação impensável para o Reino Unido que estava disposto a tudo para garantir o controlo do Canal de Suez e a rota para a Índia. Na Ásia Central, o Reino Unido e a Rússia enfrentavam-se no conflito pela supremacia na região que ficou conhecido como “Grande Jogo”. A Europa estava em paz desde 1871, mas as Potências europeias defrontavam-se diplomática e, por vezes, militarmente em África e na Ásia pela manutenção ou alargamento dos impérios que ocupavam cerca de um quarto da superfície terrestre do globo. A economia global tinha atingido os territórios mais longínquos. Este «foi provavelmente o período da história do mundo moderno na qual os governantes que chamavam a si próprios "imperadores" ou que como tal eram designados por diplomatas ocidentais, atingiu o seu número máximo.»
A Aliança Anglo-Japonesa de 1902 foi firmada a 30 de janeiro, em Londres. Assinaram o tratado, o secretário britânico para os Negócios Estrangeiros, Henry Petty-Fitzmaurice (1845-1927), quinto marquês de Lansdowne (Lorde Lansdowne), e o ministro residente japonês Hayashi Tadasu (1850-1913). O tratado foi renovado e atualizado duas vezes, em 1905 e 1911.
A aliança entre o Reino Unido e o Japão começou a ser estudada em 1895, após a Primeira Guerra Sino-Japonesa (25 julho 1894 – 17 abril 1895). Esta guerra foi uma consequência da rivalidade entre as duas Potências sobre a influência na Coreia, um Estado semi-independente vassalo do Império Chinês. A intervenção japonesa na Coreia resultou num conflito com o Império Chinês. As sucessivas vitórias do Japão, em terra e no mar, obrigaram a China a negociar a paz. A 17 de abril de 1895 foi assinado o Tratado de Shimonoseki em que a China reconhecia a independência da Coreia, pagava uma avultada indemnização, abria vários portos à navegação e ao comércio japonês e cedia a Formosa (Taiwan), o Arquipélago dos Pescadores (Arquipélago de Penghu) e a Península de Liaotung ao Japão.
A vitória japonesa ficou a dever-se ao processo de industrialização e modernização adotado nas décadas precedentes. As forças armadas tinham sido modernizadas com o apoio das missões militares europeias. A vitória japonesa permitiu ao Japão afirmar-se como a Potência dominante na Ásia; uma Grande Potência regional. A China, pelo contrário, confirmou o declínio da dinastia reinante (Qing), a corrupção da administração e a incompetência dos sucessivos governos. Este estado de fraqueza em que se encontrava o regime na China foi aproveitado pelas Potências ocidentais para ali obterem mais concessões. Tal situação acabou por desenvolver entre a população chinesa sentimentos xenófobos já que identificavam com os estrangeiros e com as importações muitas vezes impostas o crescente desemprego e pobreza. Surgiram várias revoltas e a mais famosa delas foi a Revolta dos Bóxeres (1899-1901) que obrigou à intervenção de forças expedicionárias europeias, norte-americana e japonesa a fim de socorrerem as delegações diplomáticas em Pequim.
A Península de Liaotung era estrategicamente importante para as Potências que detinham interesses na região, principalmente pelas suas condições portuárias. A cedência da Península de Liaotung ao Japão, nas condições do Tratado de Shimonoseki, não agradou, por isso, à Rússia que desejava adquirir um porto liberto dos condicionamentos do inverno. A Alemanha, que também procurava estabelecer-se num porto na China, também se mostrou contrária às facilidades concedidas ao Japão. A França, aliada da Rússia, decidiu apoiar a sua aliada. Desta forma, «os assuntos do Extremo Oriente conduziram à formação de uma coligação na Ásia, formada por aquelas Potências europeias que se encontravam em lados opostos na Europa.»] Em março de 1897, a Rússia ocupou Porto Artur e transformou-o numa base naval. Em dezembro de 1897, uma frota russa ancorou em Porto Artur e a Rússia conseguiu forçar o Governo chinês a aceitar a Convenção para o Arrendamento da Península de Liaotung, também conhecida como o Acordo de Pavlov. Esta convenção, assinada a 27 de março de 1898, concedeu à Rússia a utilização de Porto Artur (Lüshun) como base naval e a ligação àquele porto por via-férrea.
O Reino Unido e o Japão mantinham boas relações diplomáticas e comerciais desde o século XVII. Apesar de alguns incidentes em que o Reino Unido fez prevalecer a sua força militar e naval, em 1854 as duas Potências assinaram o Tratado de Amizade Anglo-Japonês e, quatro anos mais tarde, o Tratado de Amizade e Comércio Anglo-Japonês. Em 1863 chegaram à Grã-Bretanha os primeiros alunos japoneses destinados a frequentarem as universidades britânicas e, em 1869, pela primeira vez, um príncipe europeu visitou o Japão. Este foi o caso da visita iniciada a 4 de setembro pelo Príncipe Alfred, Duque de Edimburgo, filho da Rainha Vitória. Em 1873, começou a funcionar no Japão, em Tóquio, o Colégio Imperial de Engenharia, dirigido por docentes britânicos e visando formar engenheiros japoneses em vários campos industriais e para se conseguir uma industrialização mais rápida e menos dependente dos técnicos estrangeiros. A 16 de julho de 1894, foi assinado o Tratado de Comércio e Navegação Anglo-Japonês.
Os tratados, acordos ou convenções estabelecidas com o Reino Unido não foram, naturalmente, caso único da diplomacia nipónica. Os Estados Unidos da América, a Rússia, a França, a Áustria-Hungria, a Prússia, alguns países da América Latina, também estabeleceram tratados com o Japão. Portugal estabeleceu um Tratado de Amizade e Comércio com o Japão em 1861. A partir de 1872, na sequência das reformas adotadas pelo Imperador Meiji (reinado de 3 de fevereiro de 1867 a 30 de julho de 1912), o Japão adotou a organização e o serviço militar segundo o modelo alemão. Durante o reinado deste Imperador, foi estabelecido um sistema de educação semelhante ao da Europa, com escolaridade obrigatória. Milhares de estudantes foram enviados para escolas nos EUA e na Europa e mais de 3.000 professores europeus e norte-americanos foram para o Japão para ensinarem as ciências modernas, matemática, tecnologias e línguas estrangeiras. Para além do ensino, o Reino Unido teve um papel de destaque na construção da marinha de guerra japonesa.
O Reino Unido e a Alemanha tinham estabelecido o acordo sobre o regime de Porta Aberta na China (1900). Quando a Rússia invadiu a Manchúria em consequência da Rebelião dos Bóxeres (1899 - 1901) e para proteger a linha férrea para Porto Artur, o Reino Unido pediu à Alemanha para cooperar para impedir o avanço das tropas russas, mas Bülow respondeu que o acordo não se aplicava à Manchúria e que a Alemanha não tinha nenhum interesse naquele território. Na realidade, a Alemanha não desejava antagonizar a Rússia, com quem esperava poder estabelecer uma aliança. O Reino Unido, por seu lado, desejava impedir o domínio russo na região a fim de manter a política de Porta Aberta que lhe permitiria mais facilmente exportar os produtos da sua indústria. Restava-lhe, assim, estreitar as relações com o Japão.
O Reino Unido não se tinha juntado às Potências que exigiram a retirada do Japão da Península de Liaotung. Quando a Rússia conseguiu instalar-se em Porto Artur todas as outras Potências procuraram obter compensações na região o que fez aumentar a rivalidade entre elas. O relacionamento entre essas Potências tornou-se numa luta pelo estabelecimento das esferas de influência. Simultaneamente, o Japão começou a estudar a possibilidade de uma guerra contra a Rússia para impedir a continuação da sua expansão que era vista como uma ameaça aos interesses e à segurança nipónica. A expansão russa na China tornava-se, embora por razões diferentes, uma preocupação comum do Japão e do Reino Unido, tanto mais que à política de Porta Aberta defendida pelos britânicos, a Rússia contrapunha com um sistema fechado e de privilégios. Este seria certamente o momento ideal para estabelecer uma aliança entre aquelas Potências, destinada a defender os seus interesses comuns. No entanto, o Reino Unido tinha relutância em abandonar o seu “esplêndido isolamento” e não desejava apoiar os japoneses na Coreia ou colocar-se ao lado do Japão no caso de esta Potência se envolver numa guerra contra os Estado Unidos da América. As conversações tiveram início em julho de 1901 e prolongaram-se até ao início do ano seguinte.
O Tratado de Aliança Anglo-Japonês foi assinado em Londres, no dia 30 de janeiro de 1902. O Tratado continha seis artigos [Texto do Tratado, em língua inglesa e japonesa, em https://www.jacar.go.jp/nichiro/uk-japan.htm]. No seu preâmbulo pode-se ler que ambas as Potências estavam «especialmente interessadas em manter a independência e a integridade territorial do Império da China e do Império da Coreia, e em garantir naqueles países oportunidades iguais para o comércio e indústria de todas as nações».
No artigo 1, o Reino Unido e o Japão declaram não ter «tendências agressivas» em qualquer daqueles dois impérios e que os interesses britânicos se localizavam principalmente na China enquanto o Japão, que também aí detinha interesses, estava especialmente interessado, em questões políticas, comerciais e industriais, na Coreia. Ambas as Potências admitiam apoiar-se mutuamente, na China ou na Coreia, se fosse necessário intervir para salvaguardar os respetivos interesses, para a proteção das vidas e propriedades dos seus súbditos, no caso de uma ação agressiva de outra Potência ou por distúrbios que ocorram naqueles territórios. O Artigo 2 partindo das situações descritas no artigo anterior – intervenção na China ou na Coreia – levantava a hipóteses de uma das partes se envolver numa guerra com uma terceira Potência e prescrevia que, neste caso, «a outra Alta Parte Contratante manterá uma estrita neutralidade e desenvolverá os seus esforços para impedir que outras Potências de intervirem nas hostilidades contra o seu aliado.» No caso da intervenção de uma terceira Potência, ambos os aliados agiriam em conjunto, a conduta da guerra será feita em comum assim como qualquer acordo de paz (Artigo 3). Os artigos 4 e 5 obrigam ambas as Potências a manterem o contacto e a agirem em comum. O Artigo 6 determinava que o Tratado entraria em vigor assim que assinado e que teria a duração de cinco anos e seria renovável por iguais períodos.
Esta aliança passou ao conhecimento público a 12 de fevereiro de 1902. Cerca de um mês mais tarde, a 16 de março, a França e a Rússia – aliadas desde 1894 – tornaram pública uma declaração conjunta aprovando os princípios da Aliança Anglo-Japonesa, mas reservando o direito de defenderem os seus interesses. Nos termos do Artigo 2 daquela aliança e no caso de um conflito entre a Rússia e o Japão, se a França decidisse agir em apoio da sua aliada, a Rússia, o Reino Unido ver-se-ia obrigado a abandonar a situação de neutralidade e a agir contra a França. Esta perspetiva foi suficiente para manter a França longe do conflito entre o Japão e a Rússia em 1904-1905. Por outro lado, a não intervenção da França ou de outra Potência manteve o Reino Unido numa situação de neutralidade relativamente àquele conflito.
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