O território que hoje constitui a Líbia esteve dividido durante muito tempo em duas prvíncias:
- Tripolitânia, ao longo da costa ocidental, com a capital em Tripoli;
- Cirenaica, ao longo da costa oriental, com a capital em Bengazi.
Estes eram territórios
costeiros. O interior, maioritariamente deserto, era conhecido como Fazzan e,
até ao século XX fugiu ao controlo administrativo de Tripoli, a capital
de todo este conjunto (atual capital da Líbia). As guarnições militares otomanas
que no início do século XX ainda existiam na região estavam localizadas ao
longo da costa.
Este território tinha sido
capturado pelos Otomanos em meados do século XVI. Quando o Egito passou a ser
controlado pelos Britânicos, a Líbia ficou isolada do resto do Império. No
final do século XIX, o território foi objeto de competição dos interesses franceses
e italianos, tal como acontecera com a Tunísia que, em 1881, foi ocupada pelos
Franceses. Com a ocupação da Tunísia, muitos italianos estabeleceram-se na
Líbia e ali fizeram os seus investimentos. Tratavam-se, pois, de investimentos
feitos por uma Potência europeia - a Itália – num território que, embora
gozasse de uma grande autonomia, pertencia ao Império otomano.
As relações entre o Reino de
Itália e o Império Otomano começaram a deteriorar-se quando os italianos que
viviam em Tripoli recusaram aceitar a soberania judicial otomana. Noutras
regiões, por exemplo no Egito ou em Marrocos, os cidadãos europeus ali residentes
estavam sujeitos a um tratamento jurisdicional diferenciado dos naturais da
região. Em algumas regiões otomanas onde a presença europeia era mais antiga e
mais desenvolvida existia o sistema das capitulações que, para além de várias
vantagens a nível económico, atribuía aos cidadãos europeus a faculdade de se
manterem sob a jurisdição dos respetivos consulados.
No dia 23 de setembro de 1911,
o Governo italiano enviou ao Governo otomano um protesto formal referindo
perseguições aos italianos residentes na Líbia. Os Otomanos conheciam os
objetivos italianos e ofereceram a possibilidade de abrir novas concessões económicas
e a garantia de segurança dos cidadãos italianos residentes na Líbia. Contudo,
paralelamente às diligências diplomáticas, o Governo otomano enviou recursos
militares para a Líbia. A Itália não aceitou a resposta otomana e declarou
guerra ao Império Otomano a 29 de setembro de 1911. Rapidamente as forças
italianas desembarcaram na Líbia e ocuparam as cidades costeiras.
As poucas tropas otomanas
existentes na Líbia não conseguiram impedir a invasão italiana do território e
retiraram para o interior a partir de onde desenvolveram ações de resistência a
uma maior penetração italiana. A situação alterou-se quando os Sanusis, uma
tribo da Líbia e da região do Sudão, se juntou aos otomanos na luta contra os
italianos. Depressa as tropas italianas ficaram confinadas a algumas posições
costeiras onde dispunham do apoio de fogos dos navios de guerra italianos.
Contudo, não conseguindo resolver a situação na Líbia e enfrentando problemas
internos, o Governo italianos começou a agir contra outros territórios
otomanos: Beirute, no atual Líbano, foi bombardeada em fevereiro de 1912;
vários fortes que defendiam a entrada do Estreito de Dardanelos foram também
bombardeados em maio desse ano; as ilhas atualmente conhecidas como Dodecaneso,
no Mar Egeu, foram ocupadas por tropas italianas; os portos otomanos do Mar
Vermelho foram bloqueados; uma flotilha de cinco torpedeiros italianos forçou a
entrada no Estreito de Dardanelos, em julho de 1912. As ações militares
poderiam ter sido prolongadas, mas o início da Primeira Guerra Balcânica no
outono de 1912 levou o Império Otomano a aceitar que não tinha condições para
continuar a defender os seus territórios africanos.
No dia 18 de outubro de 1912,
no palácio de Ouchy, Lausanne, Suíça, foi assinado um tratado entre a Itália e
o Império Otomano, com onze artigos dos quais interessa destacar – de forma
resumida os três primeiros: o artigo 1 tratava da cessação imediata das
hostilidades; o artigo 2 tratava da retirada das tropas e pessoal civil otomano
da Líbia e retirada das tropas e pessoal civil italiano das ilhas Dodecaneso; o
artigo 3 referia-se à troca de prisioneiros de guerra.
["Treaty of Peace Between
Italy and Turkey." The American Journal of International Law 7,
no. 1 (1913):
58-62. https://www.jstor.org/stable/2212446?seq=1#metadata_info_tab_contents Visto
em 2020 janeiro 20]
Quando as tropas turcas
deixaram a Líbia, deixaram para trás não apenas as armas, mas também muitos
homens e asseguraram aos Sanussi que, enquanto resistissem aos italianos, iriam
continuar a receber apoio da Turquia. Os Italianos, por sua vez, não abandonaram
as ilhas Dodecaneso. Como a guerra se prolongou pelos anos seguintes, os
italianos empenharam tropas africanas da Eritreia, então uma colónia italiana.
Apesar dos esforços feitos, só depois da Primeira Guerra Mundial a Itália
conseguiu dominar a maior parte do território.
A Rússia mostrou simpatia pela
ação italiana porque, tendo em vista a possibilidade de controlar os
Estreitos, o enfraquecimento do Império Otomano contribuía para esse objetivo.
A França manteve uma atitude reservada porque, embora emergindo reforçada da
Segunda Crise de Marrocos, ainda não tinha estabelecido o protetorado sobre
aquela região. O Reino Unido, signatário dos Acordos do Mediterrâneo (12
fevereiro 1887) segundo os quais aceitava que a Tripolitana pertencia à esfera
de influência da Itália enquanto esta apoiaria os britânicos no Egito, não
desejavam antagonizar a Itália, pelo que se mantiveram em silêncio sobre o
assunto.
A Alemanha também não desejava
antagonizar a Itália, sua parceira na Tríplice Aliança e com a contribuição de
quem contava nos seus planos para um possível conflito na Europa. No entanto,
os seus interesses no Império Otomano estavam em crescimento e estava em
execução uma estratégia para exercer ali uma crescente influência económica e
militar. Nesta situação, o conflito entre a Itália e o Império Otomano era
encarado com apreensão. A Áustria-Hungria não desejava ver a Itália envolvida
na questão dos Balcãs e quando as ilhas Dodecaneso foram ocupadas e a Itália
ameaçou levar a guerra ainda mais longe, na Península Balcânica, o Chefe do
Estado-Maior General austríaco, Conrad von Hötzendorf, chegou a propor uma
guerra contra a Itália. No entanto, terá sido a possibilidade de uma
intervenção militar da Itália nos Balcãs, quando se iniciava a Primeira Guerra
Balcânica, que levou os Turcos à mesa de negociações [GERWARTH & MANELA,
2014, p. 38].
BIBLIOGRAFIA citada:
GERWARTH, Robert & MANELA, Erez (Editores), Empires at War 1911-1923, © 2014, Oxford University Press, New York, United States of America, ISBN 978-0-19-873493-2.
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