No dia 18 de janeiro de 1871 concretizou-se a unificação da Alemanha. Guilherme II da Prússia foi aclamado Imperador e, nesta qualidade, passou a ser designado por Guilherme I da Alemanha. Estava assim criada uma nova entidade política que assumia a supremacia no Continente europeu, qualidade que até aí tinha pertencido à França. A supremacia não significava, portanto, a impossibilidade de ser derrotado num confronto com outra ou outras potências. Se o poder militar da Alemanha era suficiente para enfrentar qualquer das outras potências europeias, já o mesmo não se poderia dizer se confrontada com uma coligação de potências e, muito especialmente, se essa coligação obrigasse a uma guerra em duas frentes, como poderia ser o caso de uma aliança entre a França e a Rússia.
Concluída a paz com a França nos termos do Tratado de
Frankfurt (10 de maio de 1871), Bismarck teve a preocupação de trabalhar no
sentido de manter o status quo, ou seja, consolidar a unificação da
Alemanha e a sua posição na Europa por forma a garantir a segurança e a
continuação do desenvolvimento económico. A anexação das províncias da Alsácia
e Lorena, por insistência dos generais prussianos, para tornarem mais
defensável o Império Alemão, foi a última alteração de fronteiras. Bismarck não
pretendia quaisquer outros ganhos territoriais à custa da França. As futuras
alterações no mapa político da Europa, que ocorreram em 1878, 1908, 1912 e
1913, iriam verificar-se nos Balcãs.
Para os objetivos do chanceler alemão, no que respeitava a relações
internacionais, manter o status quo envolvia:
- O isolamento da França;
- A manutenção de boas relações com a Áustria e a Rússia.
Com estes objetivos, Bismarck procurava, por um lado, evitar
a ameaça de uma guerra em duas frentes contra uma aliança franco-russa e, por
outro lado, não se envolver numa hipotética guerra entre a Rússia e a Áustria
por causa dos conflitos de interesses nos Balcãs. Um acordo com a Áustria e a
Rússia manteria a Alemanha num círculo de três Grandes Potências, num mundo de
cinco, o que significava que não existia, fora desse acordo, capacidade para
atacar a Alemanha. Por outro lado, Bismarck pretendia manter fortes as forças
conservadoras, dominantes nos governos da Áustria e da Rússia, contra os
movimentos socialistas e republicanos que constituíam uma ameaça para a
estabilidade dos regimes nestas potências.
Existiam ameaças aos objetivos de Bismarck. Era precisamente
nas forças mais conservadoras de França, a ala direita da política francesa,
onde a ideia de revanchisme se mantinha mais forte. As forças
conservadoras são mais agressivas e militaristas que as forças republicanas e,
por isso, era mais fácil para a Alemanha desenvolver o seu relacionamento com
uma república liberal.
Figura
6: A Europa em 1871. Ver mapa em tamanho original (2,284 × 1,503 pixels) em https://upload.wikimedia.org/wikipedia/commons/d/dd/Europe_1871_map_en.png
Adolphe Thiers negociou o Tratado de Frankfurt (10 de maio
de 1871) e ordenou a supressão da Comuna de Paris. No governo da República,
«fez um jogo político ambíguo e subtil»[3] de que
os republicanos souberam tirar proveito. No cargo de Presidente da República
Francesa, Thiers definiu-se cada vez mais próximo dos republicanos, defendendo
uma república liberal. Num discurso proferido a 13 de novembro de 1872,
declarou a sua ligação ao regime republicano. A 23 de Maio de 1873, Thiers
discursou na Assembleia Nacional e afirmou que a República era o único regime
viável em França. A maioria de representantes monárquicos reagiu e aprovou
legislação que reduziu as competências do Presidente. Thier demitiu-se a 24 de
maio de 1873.
O sucessor de Thier foi o Marechal Patrice de Mac Mahon
(1808-1893), monárquico convicto. Para Presidente do Conselho de Ministros, Mac
Mahon escolheu Jacques Victor Albert, Duque de Broglie (1821-1901), uma das
figuras do catolicismo liberal. O objetivo deste governo formado por uma
coligação de direita chamada Ordre Moral era preparar a restauração da
monarquia o que, no entanto, foi um fracasso e, no dia 9 de novembro de 1873, a
Assembleia Nacional legislou no sentido de estabelecer a duração do mandato do
Presidente da República em sete anos, estabelecendo para esta figura política
um carácter mais de acordo com a República. Mac Mahon demarcou-se dos partidos
políticos e declarou a 4 de fevereiro de 1874 que faria respeitar a ordem
estabelecida, isto é, a da República. Foi neste cenário que a Assembleia
Nacional aprovou a Constituição de 1875.
A vitória republicana nas eleições de fevereiro/Março de
1876 levou à nomeação de um governo dominado por republicanos. No ano seguinte,
na sequência dos incidentes provocados pelo movimento do ultramontanisme
(doutrina política católica, com origem em França, que procura em Roma a sua
principal referência), Mac Mahon nomeou um governo conservador chefiado por
Broglie, convenceu o Senado a dissolver a Câmara dos Deputados e marcou novas
eleições. Estas foram realizadas de 14 a 28 de outubro de 1877 e os partidos
republicanos obtiveram 318 lugares em 526, isto é, 54,4%[4] dos
lugares e Mac Mahon viu-se obrigado a formar um governo republicano. Sem o
apoio de uma maioria conservadora, Mac Mahon demitiu-se a 30 de janeiro de
1879.
Tanto o Império Austro-Húngaro como o Império Otomano
continham comunidades eslavas (Eslavos do Sul) nos seus domínios dos Balcãs.
Croatas, Eslovenos e Sérvios habitavam a região sul do Império Austro-Húngaro,
na parte que pertencia à Hungria. Montenegro e Sérvia eram principados
autónomos que se apoiavam fundamentalmente na Rússia, onde o movimento
pan-eslavista era utilizado pelo governo do Czar com a finalidade de alargar as
suas zonas de influência. A Bulgária só iria conquistar a autonomia (não a independência)
em 1878. Dos restantes territórios da Península Balcânica, a Grécia era um
Reino Independente desde 1830, a Roménia era um Principado, um Estado
independente, mas sujeito à suserania do Sultão, e tudo o mais encontrava-se
sob domínio direto do Império Otomano.
A Rússia era um dos Estados mais subdesenvolvidos da Europa,
em todos os aspetos. Politicamente, era um Estado quase feudal, uma autocracia,
onde o liberalismo ocidental era fortemente reprimido. Existiam grupos de
intelectuais que defendiam a "ocidentalização". A derrota na Guerra
da Crimeia (1853-1856) levou o Czar Alexandre II, que reinou de 1855 até 1881,
a implementar uma série de reformas: abolição da servidão (1861), reforma do
governo local (1864 a 1870), reforma do sistema judicial (1864), criação do
Ministério das Finanças (1860), reformas da educação e a reforma das forças
armadas. Todas estas reformas foram implementadas com grandes limitações porque
as infraestruturas base não existiam ou tinham grandes deficiências e também
porque existia uma forte oposição dos movimentos niilistas, populistas e
pan-eslavistas. O resultado foi uma escalada de repressão. Em março de 1881,
Alexandre II mandou preparar uma Constituição que não chegou a ser implementada
porque foi assassinado no dia 13 desse mês.
Embora a Rússia não dispusesse dos meios necessários para
agir com eficácia, não deixou de ter o acesso ao Mediterrâneo como o principal
objetivo estratégico. O Império Otomano
estava em desagregação e os sucessivos governos russos foram agindo sempre por
forma a tentarem controlar os Estreitos do Bósforo e de Dardanelos e a
expandirem-se na Península Balcânica, o que lhes facilitaria esse controlo.
Justificando-se com os movimentos pan-eslavistas, mas sem deixar de ter em
vista a expansão territorial ou a expansão das suas zonas de influência, o Czar
assume-se como protetor das populações cristãs dos Balcãs que procuram a
independência. No entanto, os objetivos russos encontram dois obstáculos
importantes: os Austríacos que tinham os Balcãs como zona de expansão e os
Britânicos que não desejavam permitir que a frota russa tivesse acesso ao
Mediterrâneo oriental, especialmente depois da inauguração do Canal de Suez em
1869.
A Áustria tinha sido derrotada na Guerra Austro-Prussiana
(1866) e, um ano depois, foi criada uma monarquia dual, o Império
Austro-Húngaro. A criação desta entidade política não resolveu minimamente o
problema das nacionalidades no Império. Existiam diversas nacionalidades para
além dos povos de língua alemã e magiar. O problema fundamental para a
Alemanha, no que respeitava à Áustria, eram as nacionalidades que, nos Balcãs,
podiam ser causa de colisão dos interesses austríacos e russos. A questão dos Sérvios
instalados no sul do território do império Austro-Húngaro, aliciados pelo
Principado da Sérvia que sonhava em reunir num único Estado todos os povos
eslavos do Sul, era a principal preocupação austríaca. Era um conflito entre
estas duas Grandes Potências, Rússia e Áustria-Hungria, que Bismarck
considerava essencial evitar.
A Itália completou a sua unificação em 1870, quando a
derrota sofrida na Guerra Franco-Prussiana obrigou a França a retirar as que
defendiam o poder temporal do Papa. Os Franceses retiraram, os Italianos
ocuparam Roma e o Papa ficou «prisioneiro no Vaticano» para utilizar as
palavras do Papa Pio IX. A Itália era um Reino com grandes atrasos no domínio
da economia, um Estado fraco que não dispunha dos meios necessários para
atingir o objetivo que considerava prioritário: libertar do domínio estrangeiro
todos os territórios de língua e sentimento italianos. Aqueles territórios eram
o Trentino e a região de Trieste, ocupados pela Áustria. Além deste objetivo, a
Itália desenvolveu, por questões de prestígio, a vontade de participar na
expansão colonial. Neste quadro, a Itália encontrou a hostilidade da Áustria
nos territórios irredentos e nos Balcãs, e da França no Mediterrâneo.
O Reino Unido era a primeira
potência económica do mundo. Possuía o império colonial mais vasto e, para
assegurar a ligação com os seus domínios ultramarinos, dispunha da Royal
Navy, a maior armada do mundo. O reino Unido é uma ilha, facto que, aliado
às capacidades da Royal Navy, lhe permitiram desenvolver um sentimento
de segurança e preferir o isolamento. Evitava qualquer acordo diplomático que o
obrigasse ao envolvimento nos conflitos em que os seus interesses diretos não
estivessem ameaçados. Em 1871, ainda não existiam rivais à potência industrial
do Reino Unido, embora a Alemanha se encontrasse em grande desenvolvimento. Os
números seguintes mostram-nos quanto o Reino Unido se encontrava à frente na
produção de minérios como o hard coal (carvão mineral de alto rendimento,
antracite) ou o ferro e na produção industrial em que o ferro e o aço são
sempre indicadores importantes[5]:
Valores referentes a 1871, em milhares de toneladas métricas.
|
Carvão |
Minério de ferro |
Ferro gusa |
Aço |
|
Áustria-Hungria |
4.970 |
864 |
292 |
36 |
|
França |
13.259 |
1.852 |
860 |
80 |
|
Alemanha |
29.373 |
3.376 |
1.424 |
143 |
|
Reino Unido |
119.235 |
16.902 |
6.733 |
334 |
[1]
COOK & PAXTON, European Political Facts 1848-1918, 1978, p. 121.
[2]
COOK & PAXTON, European Political Facts 1848-1918, 1978, p. 121
[3]
NÉRÉ, O Mundo Contemporâneo, 1976, p. 223.
[4]
COOK & PAXTON, European Political Facts 1848-1918, 1978, p. 121.
[5]
MITCHELL, European Historical Statistics 1750-1970, 1976, pp. 362-364, 388,
393-394 e 399.
[6]
MILZA, As Relações Internacionais de 1871 a 1914, 2007, p. 18.
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