sexta-feira, 17 de outubro de 2014

A Crise Franco-Alemã de 1875

Louis Adolphe Thiers foi Presidente da Terceira República Francesa entre 31 de Agosto de 1871 e 24 de Maio de 1873. Thiers acreditava que a República era o melhor regime político para manter a unidade nacional em França. Em Maio de 1873, sucedeu-lhe no cargo Marie Edme Patrice Maurice, conde de MacMahon, general que tinha participado na Guerra Franco-Prussiana. MacMahon tinha sido derrotado na Batalha de Wœrth (6 de Agosto de 1870) e encontrava-se com Napoleão III na Batalha de Sedan (1 de Setembro de 1870); foi o comandante do exército que, em 1871, derrotou a Comuna de Paris. Sendo monárquico, estabeleceu um governo da mesma tendência. Aliás, a Assembleia Nacional, neste período da república Francesa, era maioritariamente monárquica. Bismarck teria preferido um governo francês mais republicano, com uma menor probabilidade de aproximação à Rússia imperial e conservadora. Além disso, os novos governantes franceses não escondiam a vontade de se desforrarem da derrota de 1870.
Na Alemanha, após a unificação, Bismarck iniciou um movimento anticlerical, que ficou conhecido como KulturKampf. Este movimento traduziu-se num conflito entre o governo alemão e a Igreja Católica Romana, entre 1872 e 1877, período durante o qual Bismarck se apoiou no partido nacional-liberal. O objectivo de Bismarck era eliminar a influência da Igreja Católica na vida pública na Alemanha. Bismarck pretendia fortalecer o poder central do Império Alemão, em que os estados do Sul, a Alsácia-Lorena e as províncias polacas eram predominantemente católicas. Esta conflito travado contra a Santa Sé, assim como os acontecimentos relacionados com a unificação da Itália, levaram o Papa Pio IX, de tendência liberal, a adoptar uma atitude mais conservadora.

As chamadas Leis de Maio, aprovadas em 1873, 1874 e 1875, limitaram consideravelmente os direitos da Igreja Católica; limitaram ou excluíram as congregações religiosas e o ensino eclesiástico. As infracções a estas leis implicavam pesadas penas e numerosos bispos e padres foram julgados e condenados, de tal forma que, em 1876, 1.300 paróquias não tinham padre. As relações diplomáticas entre a Alemanha e a Santa Sé foram cortadas, os Jesuítas foram expulsos do Império juntamente com outras ordens religiosas. O código penal passou a incorporar um parágrafo que previa penas de prisão para os sacerdotes que, nas suas homilias ou em documentos escritos, tratassem de temas políticos.

A 24 de Maio de 1873, quando Thiers foi substituído no cargo de Presidente da República Francesa, formou-se em França uma coligação de direita, a Ordre Moral, defensora de uma política de apoio à Igreja Católica. Esta coligação pretendia a restauração monárquica. Bismarck inquietou-se com este cenário e, quando os bispos franceses de Nîmes e de Angers se pronunciaram publicamente contra as perseguições de que os católicos eram alvo no Império Alemão, exigiu ao governo francês que agisse judicialmente contra aqueles membros da hierarquia da Igreja Católica. Bismarck, pretendendo justificar a sua acção, "detectou" uma conspiração internacional, com carácter clericalista, apoiada pela França, e aproveitou este cenário para justificar a sua política de pressão sobre aquela potência. Estes acontecimentos criaram um clima de mal-estar e desconfiança entre a Alemanha e a França.

Em Abril de 1875, foi lançada a ideia de que Bismarck estaria a preparar uma guerra preventiva contra a França. A causa desta ideia foi a reorganização do Exército Francês. A França tinha adoptado o serviço militar obrigatório de cinco anos em 1872 e, em Março de 1875, fez aprovar uma lei que previa maior número de oficiais e sargentos e o aumento de efectivos dos seus regimentos. A capacidade militar dos Franceses estava a crescer rapidamente. A ideia de um ataque preventivo da Alemanha contra a França foi lançada no dia 21 de Abril, numa recepção na embaixada britânica em Berlim. Nesta recepção, o embaixador francês em Berlim, Armand de Gontaut-Biron, conversou com o embaixador alemão em Atenas, Joseph Maria von Radowitz, sobre a questão da   deterioração das relações entre a França e a Alemanha e sobre a reorganização militar francesa. Nessa conversa, Radowitz referiu a possibilidade de uma guerra preventiva por parte da Alemanha contra a França pois, prevendo a pretensão francesa de recuperar a Alsácia-Lorena, seria melhor desencadear a guerra antes que a França se tornasse mais forte e conseguisse estabelecer alianças com outras potências. Gontaut-Biron deu conhecimento desta conversa ao ministro francês dos Negócios Estrangeiros, Louis Decazes, que decidiu pedir o apoio do Reino Unido e da Rússia.

Papa Pio IX, 
fotografado a 13 de Maio de 1875

in
http://www.lombardiabeniculturali.it/fotografie/schede/IMM-3a010-0011183/


Uma nova guerra, cujo resultado seria muito provavelmente a  derrota da França, podia abrir caminho para a hegemonia alemã no continente europeu. Este facto viria causar novos desequilíbrios na balança do poder na Europa. O primeiro-ministro do Reino Unido, Benjamim Disraeli, apenas assegurou o apoio diplomático à França e solicitou à Alemanha que esclarecesse a situação por forma a desfazer a inquietação que se fazia sentir na Europa. O czar russo, Alexandre II, que não desejava a hegemonia alemã na Europa, deslocou-se a Berlim a 10 de Maio de 1875, acompanhado pelo seu chanceler Gorchakov. Desconhece-se o teor das conversas entre os governantes russos e Bismarck. Seja como for, o chanceler alemão entendeu facilmente que as outras potências não aceitariam um ataque à França. O chanceler russo garantiu ao embaixador francês em Berlim que a Alemanha não desencadearia um ataque preventivo contra a França, possibilidade que, na realidade, não era intenção de Bismarck.

Esta crise não só não impediu a França de continuar o seu rearmamento como mostrou que o isolamento que Bismarck lhe pretendia impor estava longe de ser uma realidade. Para além disto, pôs a descoberto as fraquezas da Liga dos Três Imperadores. No entanto, o equilíbrio entre as potências europeias funcionou no sentido de preservar a paz. a Alemanha continuava a contar com os seus aliados para garantir a sua defesa mas, esses mesmos aliados não estavam na disposição de lhe permitirem a iniciativa de uma acção ofensiva contra outra potência, neste caso a França.

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