quarta-feira, 2 de abril de 2025

A Guerra Russo-Turca 1877-1878

Após as revoltas que eclodiram na Herzegovina em 1875 e rapidamente se estenderam a outros territórios dos Balcãs, realizou-se a Conferência de Constantinopla (23 de dezembro de 1876 a 20 de janeiro de 1877) para introduzir reformas no Império Otomano. As propostas apresentadas pelas Grandes Potências foram rejeitadas. No dia 18 de janeiro de 1877, o Grão-Vizir Midhat Pasha (1822-1883) comunicou a recusa definitiva em aceitar as decisões da Conferência de Constantinopla.

A Rússia sempre demonstrou vontade de controlar os Estreitos de Dardanelos e do Bósforo. Este controlo permitir-lhe-ia transitar livremente entre o Mar Negro e o Mediterrâneo, situação que, naquele tempo, já se tornava problemática para os interesses britânicos porque o Canal de Suez, que garantia a chamada "Rota da Índia", já era utilizado desde 17 de novembro de 1869. Para os Britânicos, era fundamental não permitir que os Russos dominassem o Mediterrâneo Oriental.

Para a Rússia, o domínio da parte oriental da Península Balcânica, em especial da Trácia Oriental, seria a garantia do acesso ao Mar Egeu sem os condicionamentos dos Estreitos. Este facto dá uma importância acrescida à Bulgária e ao seu projeto de criação de uma "Grande Bulgária", sob influência russa. Para além destas questões geoestratégicas, poderíamos evocar as afinidades étnicas e religiosas com os povos eslavos que se encontravam sob domínio otomano, como era o caso dos Sérvios, dos Romenos e dos Búlgaros, que lutavam pela sua independência. O interesse em apoiar estes povos cresceu na opinião pública russa ao tomarem conhecimento das atrocidades cometidas pelos turcos na repressão das revoltas, o que ficou conhecido como "horrores búlgaros".

Fracassado o objetivo da Conferência de Constantinopla, a Rússia não demorou a declarar guerra ao Império Otomano. Fê-lo no dia 24 de abril de 1877. Antes disso, a 15 de janeiro, em Budapeste, a Rússia e a Áustria - Hungria estabeleceram um acordo, escrito, que confirmava os resultados do Acordo de Reichstadt, estabelecido em julho de 1876. Isso garantiu à Rússia a neutralidade benevolente da Áustria-Hungria na guerra iminente. As reuniões para este acordo, que ficou conhecido como Convenção de Budapeste, foram iniciadas durante a Conferência de Constantinopla. Mais tarde, no dia 12 de abril, o Principado da Roménia autorizou as tropas russas a atravessarem o seu território para atacarem a Turquia. As operações militares desenvolveram-se em duas frentes: no Cáucaso, onde a Rússia e a Turquia tinham então uma fronteira comum, e na Península Balcânica, especialmente nos territórios da Roménia e Bulgária.


Operações militares no Cáucaso

As operações militares no Cáucaso resultaram da invasão russa dos territórios sob domínio otomano naquela região. A Rússia dispunha de uma força de aproximadamente 50.000 homens sob o comando do Grão-Duque Michael Nikolaevich (1832-1909) que era também Governador Geral do Cáucaso. A força otomana tinha cerca de 100.000 homens sob comando do General Ahmed Muhtar Paxá (1839-1919). As forças russas estavam mais bem preparadas para o combate naquela região, mas as forças otomanas dispunham de material mais moderno. Os otomanos tinham adquirido espingardas modernas em França e no Reino Unido e a sua artilharia era, também, recente. A artilharia tinha sido fornecida pela empresa alemã Krupp.

Mapa com os principais movimentos da Guerra Russo-Turca na região do Cáucaso. Para ver com mais pormenor pode ver omapa no tamanho original em https://history-maps.com/story/Russo-Turkish-War-1877-1878

Três dias depois da declaração de guerra, as tropas russas capturaram a cidade de Bayazid (atualmente no extremo noroeste do Irão). Na região noroeste do Cáucaso, as forças russas entraram no território otomano e apoderaram-se da região de Ardahan, a 17 de maio. As unidades militares russas que partiram de Alexandrapol (atual Gyumri, na Arménia) cercaram a cidade de Kars, no final de maio. A chegada de reforços otomanos obrigou a levantar o cerco e à retirada das forças russas. Estas, após terem sido reforçadas, passaram novamente à ofensiva e, em outubro atacaram as forças turcas de Ahmed Muhtar Pasha (1839-1919), a leste de Kars. Ali, as forças russas obtiveram uma vitória na Batalha de Aladzha, a 15 de outubro, o que lhes permitiu retomarem o cerco de Kars.

O ataque russo à cidade de Kars foi retomado no início de outubro com combates nas áreas vizinhas de Kars. As forças otomanas ofereceram uma forte resistência, os russos sofreram baixas elevadas para conseguirem completar o cerco a Kars. O alto comando russo planeou um ataque noturno que envolveu uma preparação de artilharia que durou duas semanas. Assim, a primeira parte do ataque russo consistiu no bombardeamento das defesas e subúrbios da cidade, com o objetivo de desmoralizar a população civil que já ansiava pela capitulação. O assalto à cidade começou às 21H00 de 17 de novembro. O ataque beneficiou do elemento surpresa, bem como da desmoralização das forças otomanas defensoras da cidade. No dia seguinte, 18 de novembro, após intensos combates durante a noite, a cidade caiu. Os russos capturaram 17.000 prisioneiros. Destes, 4.500 encontravam-se doentes e feridos nos hospitais. Além dos prisioneiros já referidos, as forças otomanas tiveram cerca de 2.500 mortos. As forças russas sofreram 470 mortos e 1.726 feridos.

Enquanto decorria o cerco de Kars, as forças otomanas sob comando do General Ahmed Muhtar Paxá recuaram em direção a Erzurum. As forças russas atacaram a cidade, e conquistaram os fortes da sua linha defensiva. Contudo, num contra-ataque otomano, as forças russas perderam essas posições (8-9 novembro 1877). Embora as forças russas mantivessem o cerco da cidade, esta não voltou a ser atacada. Os russos entraram na cidade após a assinatura do Tratado de Santo Estêvão.

A conquista de Kars pelos Russos teve consequências duradouras. A cidade, com o território circundante, foi cedida ao império russo após o Tratado de Berlim (13 de julho de 1878). Como consequência, um número significativo de arménios deixou de viver no Império Otomano para passarem a habitar o Império Russo. Muitos tucos e curdos muçulmanos, que ali viviam, abandonaram o território e atravessaram a nova fronteira, para a Turquia.

Operações militares nos Balcãs

No início da guerra, a Rússia e a Roménia destruíram todos os navios turcos que operavam no Danúbio e minaram alguns troços do rio. Desta forma puderam garantir que as forças russas podiam cruzar o Danúbio sem encontrarem resistência da Marinha Otomana. 

O comando das forças otomanas não deu a devida importância às ações dos russos e romenos. Em junho de 1877, uma pequena unidade russa atravessou o Danúbio perto do delta, em Galați, e marchou em direção a Ruschuk (hoje Ruse). Ara os otomanos, isso era um indício claro de que o corpo principal das tropas russas avançaria pelo eixo ao longo da costa do Mar Negro.

Na noite de 27 para 28 de junho de 1877, uma força russa sob o comando do Major-general Mikhail Ivanovich Dragomirov construiu uma ponte flutuante sobre o Danúbio em Svishtov. Após uma curta batalha os russos estabeleceram uma testa de ponte na margem oposta. No dia 28 atacaram Svishtov e forçaram a retirada da força otomana que a defendia. A partir daqui, as forças russas formaram três corpos e avançaram em três direções: a força principal, sob o comando do General Joseph Vladimirovich Gourko, avançou para a cordilheira dos Balcãs, o obstáculo mais significativo entre o Danúbio e Constantinopla; uma força sob o comando do Czarevich Alexander Alexandrovich, o futuro Czar Alexandre III da Rússia, avançou para a fortaleza de Ruschuk, no flanco esquerdo russo; outra força, sob comando do General Nikolai Kridener, dirigiu-se para Nikopol, que tomou a 16 de julho, e daí avançou sobre Pleven, que manteve cercada entre 20 de julho e 10 de dezembro.

Mapa da Guerra Russo-Turca na região dos Balcãs. O mapa em tamanho original poe des visto em https://history-maps.com/story/Russo-Turkish-War-1877-1878

Neste ponto, a força russa foi dividida em três partes: o Destacamento Oriental sob o comando do Czarevich Alexander Alexandrovich, o futuro Czar Alexandre III da Rússia, designado para capturar a fortaleza de Ruschuk e cobrir o flanco oriental do exército; o Destacamento Ocidental, para capturar a fortaleza de Nikopol, Bulgária e cobrir o flanco ocidental do exército; e o Destacamento Avançado sob o comando do Conde Joseph Vladimirovich Gourko, que foi designado para se mover rapidamente via Veliko Tarnovo e penetrar nas Montanhas Balcânicas, a barreira mais significativa entre o Danúbio e Constantinopla.

Para a travessia da cordilheira dos Balcãs, a principal passagem, a que permitia o trânsito de um volume grande tropas e todo o sistema logístico, era o Passo de Shipka, com uma extensão de 27 km, a uma altitude de 1.333 m, entre Gabrovo e Kaganlik. Esta passagem importante na cordilheira foi ocupada pelas tropas russas a 21 de agosto. Pouco tempo depois, as forças otomanas lançaram um contra-ataque e retomaram o controlo daquela passagem. A força russa, que incorporava um corpo de tropas búlgaras, tentou expulsar os otomanos, a 26 de agosto, mas a batalha terminou num impasse. Os otomanos voltaram a atacar as forças russas, a 16 de setembro, mas sem sucesso. Só após a conquista de Plevna, os russos conseguiram reunir uma força suficiente para se apoderarem do Passo de Shipka. O ataque russo foi lançado no dia 8 de janeiro de 1878 e os otomanos foram derrotados. Estava aberto o caminho para Constantinopla.

Após a vitória russa em Shipka Pass, o comandante russo, Gen. Joseph Vladimirovich Gourko, começou a movimentar as suas tropas em direção a Constantinopla. No itinerário apenas foi necessário neutralizar a fortaleza Plovdiv, sob comando de Suleiman Pasha. A 16 de janeiro a cidade foi tomada pelas forças russas. As forças otomanas recuaram para os arredores de Constantinopla. Quando as forças russas se preparavam para atacar a capital otomana, os Britânicos e os Franceses intervieram e a Rússia teve de concordar em estabelecer um tratado de paz com o Império Otomano. No dia 3 de março de 1878, foi assinado Tratado de San Stefano.


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